Blog dos alunos do curso de Empreendedorismo e Sucessão da Faculdade de Administração, Contabilidade e Economia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul matriculados na disciplina 25438W-04 - Liderança e Negociação no segundo semestre de 2007 - turma 670

terça-feira, 28 de agosto de 2007

Líder e Negociação: Dos tablóides à bíblia do capitalismo

Com circulação diária de 2 milhões de exemplares, o Wall Street Journal é uma das maiores e mais veneradas instituições da imprensa americana. Em número de leitores no país, ele perde apenas para o diário USA Today. Em termos de prestígio e influência no mundo dos negócios, não há rivais. Com seus textos elegantes, visual cuidadosamente conservador e cobertura ampla e criteriosa dos grandes assuntos econômicos dos Estados Unidos e do mundo, o WSJ conquistou, em 118 anos de história, 31 prêmios Pulitzer, a coroação máxima por excelência jornalística no país.
A reputação lhe rendeu também o pomposo - mas não exagerado - apelido de "A bíblia do capitalismo". Os prêmios, o reconhecimento do mercado e a relevância sempre estiveram alicerçados em dois valores supremos: independência e correção jornalística, aliadas a uma página editorial de opiniões fortes - muitas vezes impopulares entre empresas e governos.
Para aqueles que cultuam o estilo Journal, foi um choque quando, no começo de agosto, a Dow Jones & Company, empresa proprietária do diário, mudou de mãos. Saía de cena a aristocrática família Bancroft, que comandou a publicação por mais de um século. Entrava o empresário australiano Rupert Murdoch. Pelo controle de um dos grandes ícones do jornalismo americano, um espaço que fez e ainda faz a cabeça das elites do país, Murdoch pagou 5,6 bilhões de dólares. A grande questão, agora, é o que ele realmente pretende fazer com o Wall Street Journal em suas mãos.

Rupert Murdoch, presidente da News Corporation
Idade: 76 anos
Família: Casado pela terceira vez, seis filhos
Fortuna pessoal: 9 bilhões de dólares
Onde mora: Nova York, nos Estados Unidos
Negócios: É dono da News Corporation, companhia de 78 bilhões de dólares que engloba canais de televisão, estúdios de cinema, jornais, sites de relacionamento, revistas e editora de livros
Carreira: Aos 22 anos, herdou um jornal decadente e reergueu os negócios da família. Com o sucesso da empreitada, passou a comprar outros títulos da imprensa australiana. A partir do final da década de 60, iniciou o processo de internacionalização do grupo de mídia

Polêmico, chamado de tirano por seus vários inimigos, visto como exterminador do jornalismo sério, Murdoch não é apenas um empresário sagaz. É também um homem de mídia, que praticamente nasceu numa redação. Com pouco mais de 20 anos de idade, herdou de sua família um jornal australiano à beira da falência. Ele não só recuperou a publicação como a transformou na pedra de lançamento de sua News Corp.
O grupo é hoje um dos maiores conglomerados de mídia e entretenimento do planeta, com faturamento anual de quase 29 bilhões de dólares e uma miríade de negócios que engloba, em 52 países, canais de televisão, estúdios de cinema, jornais, sites de relacionamento, revistas e uma editora de livros.
Apesar de seu sucesso empresarial, Murdoch nunca foi bem-vindo ao clube dos grandes barões da imprensa mundial. Aos 76 anos, sua imagem está muito mais associada à de um sujeito que tem como uma de suas principais estratégias de crescimento o acúmulo de alguns dos mais infames tablóides sensacionalistas do mundo -- entre eles os ingleses News of the World e The Sun. Freqüentemente é acusado de deixar de lado a ética jornalística (esse atributo tão caro ao WSJ), usando os veículos de comunicação a serviço de seus negócios e interesses.
Em razão desse histórico, a compra do Wall Street Journal por parte de Murdoch vem gerando grande inquietação. Murdoch dedicou boa parte dos últimos dias a acalmar os ânimos, com o argumento - totalmente racional - de que um empresário esperto como ele não destruiria aquilo que sempre conferiu valor ao jornal, sua credibilidade. Deixou claro também que pretende usar o centenário jornal como ponto de partida para novos negócios, que dependem de algo que Murdoch tem e os Bancroft não: dinheiro suficiente para garantir a expansão do diário. "O Wall Street Journal é uma marca poderosa, com muito ainda a ser explorado", afirmou.
Murdoch pretende ampliar em quatro páginas o conteúdo diário do Wall Street Journal, intensificando a cobertura de assuntos políticos e internacionais. Com isso, quer posicionar a publicação para roubar leitores de grandes jornais, como o USA Today e o New York Times. Está também em seus planos utilizar o conteúdo da publicação como base de outras plataformas de mídia da News Corp., como os sites de notícias e o novo canal de televisão do grupo, o Fox Business News, especializado em economia e com lançamento previsto para outubro. "Com a aquisição da Dow Jones, ficamos em condições de nos tornar a maior empresa de informação e entretenimento do mundo", discursou Murdoch. No momento, a News Corp. está atrás das americanas Time Warner e Disney, com faturamento de 45 bilhões de dólares e 34 bilhões de dólares, respectivamente.
Quase ninguém duvida que Murdoch perseguirá com obsessão sua meta. Desde os tempos em que dirigia o pequeno jornal de sua família, ele demonstra doses elevadas de obstinação e gosto pelo risco. Para convencer a família Bancroft a lhe vender o Wall Street Journal, Murdoch gastou três meses em negociações e venceu as resistências oferecendo 66% a mais que o valor de cada ação da Dow Jones. Mesmo com a oferta generosa, os 5,6 bilhões de dólares envolvidos na operação parecem pouco diante do número de leitores, do prestígio e da tradição da publicação. (Para efeito de comparação: o fundo de private equity Blackstone comprou recentemente a rede Hilton de hotéis por 18,5 bilhões de dólares.)
Isso se explica pela queda de vendas dos jornais na maior parte do mundo, o que tem levado muitos analistas a considerá-los um negócio condenado a um mercado de nicho. Nos últimos seis anos, os jornais perderam 3,4 milhões de exemplares em circulação diária nos Estados Unidos. É como se dois dos grandes títulos - New York Times e USA Today - tivessem desaparecido no período. "Os diários impressos vão ceder cada vez mais espaço a outras mídias", disse a EXAME a analista de mercado de mídia e entretenimento Laura Martin, da consultoria americana Media-Metrics.
Murdoch é de uma geração de homens de mídia que viveram o apogeu dos jornais. Ainda assim, demonstra grande poder de adaptação às ondas da era digital. No ano passado, ele surpreendeu o mercado ao investir 580 milhões de dólares na compra do site de relacionamentos MySpace. O negócio, que faturava 23 milhões de dólares por ano, fechou o ano fiscal de 2007 com um total de vendas de 550 milhões de dólares, por causa da multiplicação do número de usuários e da publicidade. Dentro da News Corp., um dos segmentos de negócios que mais crescem hoje é o da publicidade dos jornais na web, apesar de os valores ainda serem relativamente baixos (o braço de negócios mais lucrativo do grupo é o estúdio 20th Century Fox, responsável por blockbusters como o filme Titanic). Com a incorporação do conteúdo do Wall Street Journal ao portfólio de produtos eletrônicos, Murdoch quer melhorar ainda mais esses resultados.

Com o crescimento dos negócios da News Corp., o empresário resolveu adotar os Estados Unidos como base de operações. Na década de 80, ele se naturalizou cidadão americano para não ferir a lei do país que proíbe estrangeiros de ser proprietários de canais de televisão. Em 2004, resolveu transferir de Adelaide, na Austrália, para Nova York a sede de seu grupo. Em razão do tamanho de seu império e das polêmicas em que se envolveu, Murdoch foi se tornando muito conhecido nos Estados Unidos, a ponto de fazer parte do universo da cultura pop, como demonstram as várias aparições de um personagem inspirado em sua figura no seriado Os Simpsons (sátira televisiva ao american way of life, veiculada no canal Fox, de propriedade de Murdoch). Na primeira vez que isso ocorreu, o personagem que representa o empresário apresentou-se como "Rupert Murdoch, o bilionário tirano".
Boa parte dessa má fama surgiu por causa da linha ultraconservadora adotada por seus veículos, com destaque para o canal Fox News. Durante a recente invasão americana ao Iraque, por orientação dele, o noticiário deu ampla cobertura à tese do governo George W. Bush de que Saddam Hussein dispunha de um arsenal de armas de destruição em massa. Quando ficou claro que isso não passava de um pretexto americano para iniciar a guerra, a Fox News noticiou discretamente o escândalo. Murdoch também é acusado de fazer de tudo para conquistar a simpatia da ditadura comunista chinesa, um país que considera estratégico para a expansão de seus negócios. Devido à insatisfação do governo de Pequim para com o noticiário crítico ao país veiculado pela BBC, Murdoch tirou a emissora inglesa do pacote de canais oferecidos na China pela Star TV, de propriedade da News Corp.
Na vida pessoal, Murdoch é midiático (para usar uma palavra da moda). O término de seu segundo casamento, de 31 anos, com Anna Murdoch, com quem tem três filhos, foi um escândalo sob medida para figurar nas manchetes dos tablóides da News Corp. Apenas três semanas após o divórcio, Murdoch casou-se com uma executiva de sua empresa, a chinesa Wendi Deng, 36 anos mais jovem. Desse relacionamento nasceram seus dois filhos caçulas: as meninas Grace, de 5 anos, e Chloe, de 4. Quase octogenário, Murdoch não dá sinais de que irá desacelerar o ritmo de trabalho. Trata-se de uma postura que vem atravancando qualquer iniciativa de sucessão na News Corp. Dois de seus filhos estão a seu lado no comando dos negócios: Lachlan, de 35 anos, e James, de 34. Mas hoje ninguém se arrisca a dizer qual deles pode emplacar. Murdoch mantém-se firme. "Pretendo comandar esta companhia enquanto tiver domínio de minhas faculdades mentais", afirmou em entrevista recente à revista Business Week.
Fonte: Portal Exame por Luciene Antunes